domingo, 9 de novembro de 2008

O FLAUTISTA DA ESTAÇÃO DA LUZ

Tudo que não se vê é mais fácil de imaginar?

Não sei o que me faz prestar tanta atenção nas coisas. Talvez um desejo inconsciente de desviar o olhar de mim para o outro. E não me importa quem ou o que seja o outro. Qualquer coisa pode ser recreio para os olhos. Literalmente. Confesso, podem me tirar todos os sentidos, mas não suportaria viver sem a visão. Tudo pra mim é muito visual. Por isso entendo aquele amargor no final da vida de Jorge Luís Borges. Tudo isso pra dizer que, como sempre faço depois de sair da Estação Pinacoteca, passei na Estação da Luz, mas dessa vez para registrar algumas imagens em P&B. Um dia perfeito para elas. A luz dramática do final da tarde, o metrô ainda bastante movimentado, personagens anônimos incríveis. Muitos estranhos. Ser estranho é tão bom, né? Não há preocupação com a vergonha de ontem e nem com o medo de amanhã, apenas vive-se no anonimato de ser. Longe da movimentação de passageiros, um casal de namorados (ou seria amantes?) se destacava dos demais pelas suas “feições petrificadas de alheamento”, encostados à grade de proteção, no piso superior. Uma cena que me lembrou, imediatamente, uma reportagem da Marie Claire sobre a China que li, nos anos 90. Fiquei ali por algum tempo e depois fui embora. A imagem da mãe boliviana apoiando o filho para que ele visse a partida do metrô é uma das melhores que já fiz até hoje. Enfim, julgava já ter tido um dia bom, uma aula boa, imagens interessantes, mas, para minha total surpresa, naquele mar de gente que invade a Estação, de minuto a minuto, vejo um velhinho tocando uma flauta, solitariamente, numa dessas escadas que intermedeiam as rolantes e que as pessoas só as usam, quando não há outro jeito. Fiquei olhando um pouco pra ele, louco pra registrar aquele momento, mas segui adiante. No entanto, não pude cruzar a catraca, voltei para fazer aquela imagem. Claro, pedi a autorização e ele ma concedeu. Aproximando mais, porque ele também não me ouvia direito, percebi que era cego. Não só cego como tinha também um olho vazado. Imaginem, vocês, uma pessoa com todos os motivos do mundo para ser infeliz, mas que, ainda assim, não aparentava tristeza. Melhor, não vivia tristeza. E sem amigos, mas com uma flauta. Fiz um videozinho, o primeiro que posto aqui, desse momento tão tocante. Espero que vocês gostem.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ainda não conheço a Estação da Luz... deve ser um dos locais mais belos da cidade... achei muito interessante o video e seu texto sobre o flautista... sobre não aparentar tristeza, mesmo sem amigos ou toda essa merda do capitalismo que precisamos consumir...
um dia desses vc me apresenta a estação da luz
abraçosssss

Lore.

[Farelos e Sílabas] disse...

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Acabei comentando mais sobre o flautista da Estação no post anterior... confira, amigão!

Abraço em notas bemóis!

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