terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

RESTOS DO CARNAVAL

























A volta pra casa não poderia ser mais receptiva, um lindo arco-íris já nos esperava, no começo da Serra, nos saudando ou sinalizando para um novo tempo de alianças e recomeço. E é sempre assim que me sinto, depois de longas viagens, revigorado e pronto para o que der e vier. Claro que, lá no fundo, existem também um pouco de melancolia e a saudade dos amigos que fiz e deixei em Salvador, mas tenho certeza de que, mais cedo ou mais tarde, vou visitá-los novamente. Aproveito também, para agradecer, desde já, a todos que comentaram aqui, ou melhor, que “fizeram” essa viagem comigo. Agora que já estou em casa, vou poder visitar os blogs e me atualizar de tudo que anda rolando na bloguesfera.
O post vai ser um pouco bagunçado mesmo, vocês me desculpem, por isso o título “Restos do Carnaval”, muito inspirado naquele conto homônimo da Clarice Lispector e no que vivi durante os meus dias de folia. Pra começar, o saldo do meu primeiro carnaval, em Salvador, não poderia ter sido melhor: muita diversão, zero de aborrecimento, sem me envolver em nenhuma briga ou mesmo ser vítima de algum roubo ou coisa do gênero. Graças a Deus e a todas as forças que governam esse estado maravilhoso! Saí, todos os dias, no trio da Daniela Mercury, e, entre tantos momentos inesquecíveis, destaco o dueto dela com Caetano Veloso em “Mimar Você”, quando cantou “Milagres do Povo”, em frente ao seu camarote, e, andando na rua, perto do Farol, cercada de seguranças, agradecendo emocionada aos seus fãs e foliões. No ensaio “O carnaval visto de cima”, Camille Paglia conclui que “cada peregrino que vai ao carnaval de Salvador se torna um cidadão soteropolitano e uma parte viva da história da cidade”. Ela tem toda razão. Em poucos lugares me senti tão integrado à cultura quanto lá.

Por um golpe de sorte, me permitiram entrar nos Filhos de Gandhy e fotografar, por míseros três minutos, a passagem do “tapete branco da paz” pela Barra. Não quero parecer piegas, mas ainda que seja, não me canso de dizer que esse foi o dia mais emocionante. É um dos blocos mais lindos e tradicionais (61 anos) de Salvador. Vocês podem conferir nas imagens. O som dos agogôs, o cheiro de alfazema, aquelas roupas branquíssimas contrastando com o céu azul,... Voltei pra casa com o espírito nas alturas. Eles fazem o maior sucesso entre as mulheres e os gays. É comum até as meninas ganharem um colar de contas azul e branco, em troca de um beijo na boca. Uma amiga de São Paulo conseguiu um e ficou toda feliz. Em Ondina, no final do percurso, eles fazem até fila e “maliciosamente” propõem o “escambo” rs. Mas, que fique bem claro, essa prática, sem dúvida, deve ter sido inventada por algum turista e em nada chega a macular a seriedade dessa instituição baiana. Eu, particularmente, acho até divertido e até pretendo, um dia, sair no bloco.

Assisti pela TV ao desfile da Unidos da Tijuca e achei um show de criatividade do Paulo Barros. Indiscutível o primeiro lugar. Aprovo essa reinvenção das escolas de samba, porque, cada vez mais, os desfiles estão se tornando técnicos, com ótimos recursos cenográficos, enfim, um espetáculo para os olhos mesmo. Mas achei fraca a nova transmissão da Globo. Lá pelas tantas, quando a Glenda Kozlowski comentava sobre uma ala da Grande Rio que homenageava a imprensa, Luiz Roberto me saiu com essa: “O que seria do carnaval sem a imprensa?”. Vou fazer de conta que não entendi. E o que foi a Madonna agradecendo em italiano a sua “felicidade” em estar, no carnaval do Rio, hein? Lamentável. Vendo depois as imagens, nas revistas, fiquei em dúvida. Era ela mesma ou a Meryl Streep? Bem, chega de carnaval, os dias de ócio terminaram, agora o ano começou de verdade e a vida deve seguir mais séria. Abração!!!

domingo, 14 de fevereiro de 2010

MILAGRES DO POVO BAIANO






















Continuo em Salvador, em pleno carnaval baiano, por isso resolvi postar rapidinho mais algumas notas de viagem, antes que as notícias se tornem datadas demais. Não deve ser difícil imaginar que por aqui a folia não para. A cidade está repleta de turistas e esse volume de gente, ao mesmo tempo em que encanta, também causa muitos transtornos. Se locomover nesses dias, por exemplo, requer uma dose extra de paciência. O trânsito de Salvador, que já é caótico, fica insuportável, os supermercados cheios, as praias bem mais concorridas, enfim, uma bagunça, mas também não é nada fora do que qualquer pessoa inteligente já imaginasse, afinal é uma mega festa ao ar livre. Surpresa mesmo foi sair, ontem, no trio da Daniela Mercury, pois nunca tinha tido essa experiência. Comprei uma máscara azul linda (para estar de acordo com o tema proposto por ela) e coloquei o meu bloco na rua. Não fui o percurso inteiro porque não dava mesmo, é muito empurra-empurra, rola de vez em quando umas brigas e a polícia daqui é naturalmente truculenta. Melhor não se arriscar. Mas o som estava excelente, é um show mesmo, tinha até uma mini orquestra. Os puristas devem ter ficado de cabelo em pé, mas eu adorei. Só estranhei um pouco esse apartheid em relação às cordas, aos camarotes, porque o folião menos abastado tem que se aglomerar numa extensão de calçada mínima, se não quiser ficar na faixa de areia da praia. Consultei algumas pessoas aqui e elas acham isso muito natural, um mal necessário. Também não entendi porque o Ministério da Cultura patrocina o trio de Ivete Sangalo, sendo que ela é uma cantora que se vende sozinha, como se diz no jargão corporativo. Coisas da indústria do Axé. Por falar em Ivete, abro aqui um parênteses para falar da rixa entre as divas baianas. Elas mesmas não assumem e nem desmentem a concorrência acirrada, mas são os fãs que colocam lenha na fogueira. Se um ficar perto do outro pode até sair briga. Ganha o folião, claro, porque cada uma se esmera para estar melhor no circuito.

Existe uma atmosfera sexual pulsante na cidade, talvez pela forte presença africana aqui, muito bem resumida naquele verso de "Milagres do Povo", de Caetano Veloso: “É pura dança, sexo e glória”. É difícil explicar com palavras, mas é notória, em cada canto da cidade, essa energia que impulsiona o desejo. E tem o fator ousadia baiana que não podemos esquecer. A sensação entre os jovens, por exemplo, é um grupo chamado Psirico, cujas músicas tem um forte apelo erótico e todos, homens e mulheres, literalmente rebolam quando eles passam. Não é à toa que a música mais comentada, até o momento, é "Rebolation". Nem é preciso dizer também que os gringos ficam alucinados com isso, né? No prédio onde estou hospedado, tem argentino, americano, mexicano... E vamos nos conhecendo, misturando sotaques, é muito gostoso. O mais bacana é que essa Torre de Babel consegue se entender apenas pela magia da música.

Antes da maratona carnavalesca começar, fui ao Recôncavo, onde mora boa parte dos meus parentes. Lá, as cidades são tão pequenas, charmosas e o tempo parece até correr mais devagar. Foi ótimo mudar de ares porque pude revê-los, ficar na casa da minha avó, com direito a todos os mimos e carinhos, o clima também é mais ameno, as pessoas são muito generosas... Sem contar os personagens pitorescos que existem, como a Dona Feliz, que fica sempre na sua janela acompanhando o movimento da rua, o Ligeirinho que abordei levando um buquê de flores para o Forum, um rapaz, que todos julgam louco, e que passa o dia puxando um carrinho de brinquedo... Em muitos momentos, me senti dentro de uma crônica da Cecília Meireles. Foi bacana também sair com os meus primos menores, meus tios, ir a sítios, enfim, programas bem simples, mas que nos deixam com o coração aquecido.

Sempre quis conhecer Dona Canô, 102 anos, mãe dos cantores Caetano Veloso e Maria Bethânia, de quem sou fã, por isso não perdi a oportunidade de ir a Santo Amaro para vê-la. Os detalhes desse encontro ficam para um próximo post, porque foi tão rico e mágico e emocionante que poderia se perder numa simples nota de viagem, mas, se eu viesse a Bahia só por essa razão, já teria valido a pena. Bem, vou ficando por aqui. Da janela já vejo os trios descendo a Av. Sete de Setembro, é sinal de que vai começar tudo outra vez. Vou tentar recuperar o meu fôlego, tomar uma água de coco e aproveitar o reinado de momo. Talvez role o After da Rainha, bem mais tarde, porque aqui todos os ritmos se encontram e todas as pessoas se entendem. Incrivelmente. Beijos carnavalescos!

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

NOTAS DE VIAGEM
























Já faz alguns dias que estou em solo baiano. Minha primeira parada foi em Salvador, onde eu, minha mãe e meu irmão desembarcamos sob um calor de 30 graus, mas a sensação térmica para nós que víemos de São Paulo era de 50. Já estive na cidade, há dez anos, mas dessa vez tem sido bem diferente, porque estamos “morando” temporariamente na capital baiana. Não sem alguns aborrecimentos, mas nada que nos tire o prazer de estarmos numa cidade muito especial, cheia de contrastes, porém com uma atmosfera bem peculiar.


A Festa de Iemanjá era a mais comentada, quando chegamos, porque funciona como uma prévia do Carnaval. Dois dias antes, 31 de janeiro, estivemos no Rio Vermelho, palco da festa, e os preparativos já estavam a todo vapor, contrariando o clichê de que o baiano é preguiçoso. Digamos que ele tenha um ritmo diferente, mais calmo, e que às vezes soa até como um charme. Nesse dia, as barracas estavam sendo montadas e os pescadores decorando os seus barcos. Fiz imagens lindas de lá. O céu continua com um azul impressionante. Meu irmão, que já viajou quase o mundo inteiro, me disse que nem na Grécia tem um céu assim. E eu acredito.


A Festa é emocionante, talvez as imagens que fiz ainda não captem a sua grandiosidade, mas, pelo menos, dá pra se ter uma vaga ideia. Mesmo para quem não é do candomblé como eu, vale muito a pena ir e participar como um turista diante de uma manifestação cultural de séculos de existência. O Rio Vermelho lota durante todo o dia e tem muita música, dança, vendedores de rosas, de lembrancinhas, banho de alfazema e, claro, a alegria inconfundível do povo baiano. Os gringos ficam loucos, não param de tirar fotos. Por falar nisso, tenho sido confundido invariavelmente com eles, o que levam os vendedores a inflacionar muitas coisas que pretendia levar na bagagem.


Um dos motivos da minha viagem foi também clicar Salvador e o modo de vida e de se relacionar dos soteropolitanos, a arquitetura, como se divertem, etc., por isso não descanso um segundo, faço os roteiros mais turísticos e os mais inusitados também, como uma parada na Feira de S. Joaquim, na Cidade Baixa. Essa feira é bem conhecida por vender toda sorte de produtos da terra e oferendas para os deuses africanos. Não sei exatamente o que aconteceu, mas passei mal lá, como se uma energia muito forte estivesse sugando as minhas forças. Não quero entrar na discussão da presença do sobrenaturaal, mas não queria deixar de comentar isso. O lugar também não me pareceu seguro. Aliás, Salvador é assim, há lugares maravilhosos, há lugares bem decepcionantes, sujos, perigosos, tenho sempre que estar muito atento. Mas também basta olhar o mar que já esqueço qualquer perrengue. Fui apenas à praia do Porto da Barra, mas também não me importo muito, porque praia já temos várias no Guarujá.


O Pelourinho continua sendo um dos lugares mais visitados, mas, desta vez, não vi muitos turistas, não. Talvez seja ainda reflexo da crise. Mas ainda é um passeio que recomendo, porque tudo ali fica perto, Elevador Lacerda, Igreja da Conceição da Praia, Mercado Modelo, Praça da Sé, um pouco mais à frente fica a famosa Praça Castro Alves... Dá pra fazer tudo a pé, num único dia. De preferência, à tarde, para dar tempo de pegar o pôr-do-sol no MAM, no Solar do Unhão, um dos museus mais lindos que já conheci. A restauração do solar foi feita pela arquiteta Lina Bo Bardi, a mesma que desenhou o MASP, em São Paulo. O acervo é pequeno, mas precioso, com destaque para figurões da fotografia baiana como Pierre Verger, Mario Cravo Neto, Christian Cravo e artistas plásticos locais como Iuri Sarmento. Toda a natureza cerca o solar e um passeio ali se torna inesquecível. Tem um café no subsolo delicioso, lá se pode também tomar um drinque no pier e ver os navios passando, ir até o jardim das esculturas, conhecer a história do museu, na Linha do Tempo, enfim, uma maravilha. Sem contar que os atendentes são atenciosos e simpáticos e o catálogo deles é de primeira, lindo mesmo.


Fui a duas baladas bem conhecidas, a OFF CLUB, na Barra, e outra assinada pela San Sebastian, no Rio Vermelho. Dizem que é a casa mais bombada do momento. O som começou péssimo, com Djs brigando e a pista morna, mas depois deu tudo certo e o DJ Tony Moran consertou o que parecia irreversível. Também só na Bahia para uma balada acontecer numa "livraria e pizzaria" e dá certo. Bem, no quesito música, eles arrasam mesmo, até uma bandinha de rua, bem simples, consegue fazer um som contagiante.


Vim para o interior recarregar as energias para o Carnaval, porque Salvador nesses dias é uma função só, mas, chegando a São Paulo, já respondo a todos e passo a seguir os blogs que faltam. Obrigadão a todos e que a força do sagrado ilumine as nossas vidas! Abração!