Depois de acompanhar o nosso
carnaval interminavel e xoxo pela TV, a pretexto de matar a saudade do Brasil,
a semana seguiu melancolica por essas bandas geladas, mas ontem o sol deu as
caras por aqui e eu me animei e fui pra rua comemorar. O que? O fato de estar vivo, oras. Simples
assim. Depois de ler e me emocionar com uma mensagem deixada pela empresaria
Eliana Tranchesi, antes de morrer, no blog da sua filha, e tambem a reportagem
de capa da revista Epoca desta semana, com o ator Reynaldo Gianecchini (de quem
sou fa, admito), percebi que as vezes reclamo demais. Meus amigos mais proximos
veem nisso ate um certo charme, uma marca registrada minha, “Ah, Luis, voce e
um velhinho. Se voce nao reclamar, nao e voce”. Claro que a maioria das vezes a
minha rabugice e pura cena, mas, ainda assim, resolvi ligar o sinal de alerta. O lema agora e: “Aproveitar o dia”. Mas
aproveitar mesmo. E quem sabe ate me distanciar um pouco dessa dor chamada arte.
Bom, depois de caminhar pelo centro de
Amsterdam e uma tentativa frustrada de ir ao Jewish Historical Museum, corri
para assistir ao Artista, nos 45 do
segundo tempo, afinal o Oscar estava chegando e prometia consagrar essa terna
obra-prima do cinema. De cara, o filme nao me pegou, demorei um pouco ate me
acostumar com essa nova velha linguagem do cinema mudo. Dito assim, a queima roupa,
voces podem achar que estou trocando as bolas, mas logo vao me entender.
Resumindo bem, O Artista, de Michel Hazanavicius, conta a historia de um ator
do cinema mudo, George Valentin, as voltas com as suas frustracoes
impulsionadas pelas novas transformacoes do cinema, ao passo em que vive uma
torrida paixao por uma aspirante a atriz, Peppy Miller, mais ambiciosa e que
pensa exatamente o contrario que ele, ela ve no cinema falado uma otima
oportunidade de alavancar sua carreira. Coloque ali varias referencias
cinematograficas, varias mesmo!, no visual, na trilha, intertextualidades com
varios filmes (De Chaplin a Cinema Paradiso), uma fotografia e figurinos
deslumbrantes, uma atuacao impecavel de Jean Dujardin e, pronto, emocao pura. Ah,
claro, e um caozinho charmoso chamado Ugiee que, ca entre nos, deveria estar na
disputa para melhor ator coadjuvante. Um filme delicado, poetico, que cada um
vai assistir e perceber-lo de maneiras diferentes, “Ah, e so uma homenagem boba
ao cinema”, “Ah, e legal mostrar as novas geracoes como eram os filmes mudos” e
por ai vai. Ledo engano, acho que o filme encanta nao apenas por mostrar que o
gesto, a delicadeza, a expressao, o trabalho de ator esta sendo substituido por
efeitos especiais e um monte de artificios criados pela propria industria para
acompanhar a evolucao do cinema, mas mostra tambem o quanto estamos perdendo a
inocencia, o quanto somos expostos diariamente a tantas e tantas informacoes, ao
ponto de causar estranheza uma linguagem que de nova nao tem absolutamente
nada. Cinema e e sempre sera imagem e, quando houver uma boa historia por tras,
o casamento sera perfeito. Acho que as cinco estatuetas do Oscar estao de bom
tamanho e viva a inteligencia no cinema.
Depois aceitei a sugestao de um amigo
para ver “Estamos Juntos”, um filme nacional de Toni Venturi que eu ja queria
muito assistir, desde que sai do Brasil no ano passado, protagonizado e
produzido pela otima e jovem atriz Leandra Leal. Esse e um daqueles filmes que
nos revira de cabeca pra baixo e nos faz perceber que a vida e mesmo muito
rara, como diz a cancao do Lenine e que no final do filme ganhou uma versao
excelente, na voz da Elza Soares. O roteiro e sobre a vida de uma jovem medica, Carmem, que descobre
que tem uma doenca grave, exatamente quando esta numa otima fase da sua vida.
Sem muitos amigos – apenas um gay,
vivido de forma muito ruim por Caua Reymond –, e com uma relacao (imaginaria?)
com um homem misterioso, ela conhece o prazer sexual com um jovem musico
argentino, mas nao se liga a ele afetivamente. Com o avanco da doenca, Carmem tenta driblar as dificuldades, a medida em que vai conhecendo seus medos, suas angustias e mudancas pelo meio do caminho sao inevitaveis. Em alguns
momentos, ele nos remete a “Mentiras y Gordas”, um filme espanhol de 2009, bem
interessante por sinal. Duas coisas eu curti muito nesse filme: apesar do tema,
ele nao e nem um pouco moralizante (olha, aproveite a vida enquanto ha tempo!)
e segundo que ele e tao bem feito (com um que de filme argentino) que so veio a
se unir a filmes mais intimistas que estao sendo produzindos agora no Brasil, como o
tambem otimo Como Esquecer, de Malu De Martino. E eu que nao esperava que o
filme corroborasse essa minha nova urgencia de aproveitar melhor o dia, so
posso dizer que a vida nao so imita a arte (e vice-versa), mas principalmente
se surpreende com ela.