Ontem assisti ao filme O Palhaco,
do talentoso Selton Mello. O filme e tao simples que chega a causar uma certa
estranheza, mas o tema me tocou profundamente: essa luta ingloria que todo
artista trava consigo mesmo, em maior ou menor grau, para conseguir viver do
seu oficio, sem maiores traumas. O filme nao tem o mesmo rigor tecnico de Feliz Natal (2008), seu
longa anterior, mas nao deixa de fazer parte do que esta se tornando uma marca
ou uma linguagem dos filmes que ele assina como diretor: ir na contramao do
mainstream. E quando falo contramao e contramao mesmo! Por outro lado, acho que
esse e bem mais popular que Feliz Natal, talvez por ter o circo como pano de
fundo para a crise existencial do palhaco Pangare, o protagonista, interpretado
pelo proprio Selton. O roteiro e centrado num momento crucial da vida desse
palhaco lirico criado pelo ator/diretor: quando ele descobre que faz todos
rirem, mas “quem o fara rir tambem?”. Um argumento simples, mas que ao longo do
filme vai se desdobrando em situacoes de
extrema poesia, delicadeza, passando por dialogos leves, com um humor acido,
uma fotografia em tons de terra, quase sepia, ate chegar ao final, num
reencontro fascinante do palhaco com ele mesmo.
O filme tem muitos pontos
positivos, alem daqueles que eu acabei de citar, mas pra mim o destaque mesmo sao
as participacoes especiais: Jorge Loredo, Jackson Antunes, Fabiana Carla,
Ferrugem, Danton Mello, Tonico Pereira, enfim, uma galera que entra e rouba a
cena na mao grande. Sem do. E ainda bem que Selton nao ve nisso uma competicao
desleal, um problema, quer mesmo que esses atores brilhem da melhor forma possivel.
O cantor multi talentoso Moacyr Franco, por exemplo, faz tao bem o papel de um
subornavel delegado de cidade do interior, que levou, merecidamente, o premio
de melhor ator coadjuvante no Festival de Paulinia, do ano passado. A cena
realmente e muito boa. Porem, em alguns momentos, cheguei a me
perguntar se encher um filme de excelentes participacoes especiais nao tiraria
o foco do protagonista. Terminei me convencendo de que eu e
que tinha que mandar o meu racionalismo as favas. Foi o que eu fiz e so entao
me deixei envolver pelo filme por inteiro. E dai pra frente foi so emocao.
Paulo Jose, que e o meu ator brasileiro
favorito, faz muito bem o papel do pai de Pangare, mas senti falta de cenas mais
elaboradas para ele. Fica aqui a minha bronca. A atuacao do proprio Selton tambem
me despertou uma duvida. Quando Pangare esta no picadeiro, tenho a impressao de
que o Joao Grilo, de O Auto da Compadecida, tambem esta por ali, no gestual e
ate na intonacao da voz. Nao sei se isso foi proposital, se ele quis flertar
com esse lado autobiografico ou se foi uma mancada mesmo, por ter que estar em
dois lugares ao mesmo tempo. Achei fraca tambem a solucao do roteiro de mostrar
a busca da identidade (o documento) para
reforcar que o Pangare esta em busca da propria identidade como artista, mas
nao e nada que comprometa tambem o filme como todo. Gosto mais da ideia de
inserir o ventilador como um objeto simbolico, intrigante, que me remeteu aos
moinhos de vento do livro Dom Quixote. Mas, ainda assim, o Pangare, com toda
sua ternura, ja esta na galeria dos personagens inesqueciveis do nosso cinema. Podem
conferir. E, se os ventos do Norte tem mostrado que chegou a hora de
reverenciar o cinema, dar a vez a uma certa inocencia – estao ai filmes como O Artista e A Invencao de Hugo Cabret que nao me deixam
mentir –, nos tambem temos a nossa homenagem a Chaplin: bem mais original e, o
que e melhor ainda, sem que a industria americana nos impusesse.
Postado por Luis Fabiano Teixeira COMENTARIOS
Postado por Luis Fabiano Teixeira COMENTARIOS
3 comentários:
Adoro suas resenhas de filmes. Preciso ver esse: me instigou a curiosidade! Mas confesso que sempre tive um medo doido de palhaços (e do Papai Noel também... :))
OI Lúis, naõ asssitir o filme, mas fiquei curiosa com a sua impressão sobre o filme.
Beijos, feliz dia do bogueiro a vc.
Me deu até vontade de assistir... rs
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