sábado, 14 de janeiro de 2012

"DERCY" NAO VAI DEIXAR SAUDADES


Atendendo a pedidos, vou escrever as minhas impressoes sobre a microsserie “Dercy de Verdade”, que a Globo apresentou nesta semana, assinada pela Maria Adelaide Amaral com direcao de Jorge Fernando. Assim que a imprensa comecou a publicar as primeiras notas sobre o projeto, no comeco do ano passado, achei arriscado a autora praticamente emendar Ti-Ti-Ti com a microsserie, embora ela tenha escrito tambem a biografia que a inspirou. O mesmo pensei sobre Heloisa Perrisse que mal saiu de Cordel Encantado e foi direto protagonizar a primeira fase da microsserie. Deu no que deu. Apesar de pontos muito positivos, tudo soou oscilante, com excecao da direcao de arte e fotografia. Mencao honrosa para trilha sonora tambem. Nao houve uma unica pessoa com quem eu comentasse que nao dissesse a mesma coisa: “Foi rapida demais”. Como contar a vida de uma mulher que viveu mais de cem anos em apenas quatro capitulos? Sem contar que ao misturar imagens de arquivo com as cenas ficcionalizadas (ou quase) a microsserie pareceu ainda mais confusa. Mas isso nao foi tudo.
O problema principal, pra mim, foi a falta de um conflito central convincente, forte. Dercy Goncalves nao foi uma mulher de paixoes arrebatadoras e muito menos uma diva no auge da sua carreira. Tinha um tipo fisico esquisito e pelo que se sabe ate um pouco assexuada. Contar o que entao? Como tornar a sua biografia interessante? Claro que a alternativa era focar na carreira artistica que ela levou tao a serio e tao bem e repetir ao maximo aquelas frases: “As pessoas achavam que eu era puta. Eu sofri toda sorte de preconceitos, mas o publico nunca falhou comigo, ele sempre me aplaudiu...”. OK, tudo isso aconteceu, mas na microsserie ficou bastante cansativo, mesmo porque com aquele ritmo galopante a justificativa para o conservadorismo dela se perdeu. A unica coisa que realmente desconheciamos sobre a artista. Numa conversa banal de bar, ficamos sabendo que a sua filha foi rejeitada no Tenis Clube por ser filha de Dercy Goncalves. Ou seja, um otimo argumento para uma daquelas cenas comoventes que so a Maria Adelaide sabe escrever, mas que o formato da microsserie engessou. Pena. E assim foi com a cronologia. Uma imagem de passeata relampago aqui e entramos nos tempos da ditadura militar, volta pro palco, corta pra imagens do desfile da Viradouro... Aquela opcao clownesca ou chapliniana (como preferirem), no comeco, tambem nao me agradou. Parecia um deja-vu, precisamente Chocolate com Pimenta, novela de Walcyr Carrasco cuja direcao era tambem de Jorge Fernando. E tanto Heloisa Perrisse quanto Fafy Siqueira ficaram no meio do caminho em suas interpretacoes, as cenas mais dramaticas foram bem convincentes, emocionantes ate, mas as mais engracadas me pareceram bem forcadas. Quanto a isso eu acho que merece ate um desconto, afinal teatro filmado e sempre muito dificil. Sem contar que a figura da comediante ainda esta muito viva na nossa memoria, ne? Alias, um tipo raro de comediante, daqueles que bastam existir para provocar o riso. No caso da Dercy, meia duzia de palavroes ajudava bastante tambem.
E os atores? Gostei bastante do trabalho do Cassio Gabus Mendes e do Tuca Andrada, mas os mais jovens... Vou citar apenas um aprendiz de canastrao pra nao ficar chato. Aquele rapazinho que fez o papel do Boni nao deveria estar nem em Malhacao. Por que interpretacoes tao mediocres? So para nao comprometer o visual dos personagens? As proprias protagonistas nem ficaram assim tao identicas a Dercy. Falha imperdoavel. Outra coisa que eu nao gostei tambem foi a ausencia de sofrimento. Nao e porque a comediante “nao pensava na morte” que temos que ficar com essa falsa sensacao de que ela realmente nunca sofreu de verdade. Alias, de verdade mesmo so tinha o titulo, tudo muito sublimado. Eu espero que nao facam o mesmo com o remake de O Tempo e o Vento e Gabriela que vem por ai... Os dias ja passam voando e a Globo nao precisava reforcar isso com “Dercy”. Continuo guardando uma imagem que tenho dela, num programa bem tosco que ela fez no SBT, ja no apagar das luzes, onde lutava bravamente para decorar o texto, contracenando com um jovem ator desconhecido. Ali, pra mim, ficou inegavel o quanto aquela mulher amava o que fazia, estar no palco. Ate o fim. A microsserie explorou muito bem isso, a audiencia correspondeu, mas nao vai deixar saudades.

3 comentários:

Anônimo disse...

Juro que lamento com a alma.

Tiago Cardoso disse...

Concordo, não deixa saudades. Não tenho vontade de assistir de novo. Com excessão do final em que Dercy desce do palco e segue no meio da plateia em direção a luz. Esse momento foi o mais emocionante da série pra mim. Acho que por causa do fator morte que mexe com a gente de qualquer forma. Mas infelizmente não marcou em mim como uma obra referencial.

Ma disse...

Também achei que foi num tiro a série. Pra mim, o pior de tudo, coisa que raramente vejo na globo foi a falta de cuidado com a escolha do elenco. Grande parte das interpretações eram de medianas a ruins ou muito ruins ! Achei a interpretação da Heloisa Perissé e da Fafi muito boas, mas perderam o brilho por conta dos atores fracos próximos.... e quanto ao Boninho fazendo o papel do pai, gente, o que foi aquilo? Eu dirigindo gente que nunca fez teatro atuava MUITO melhor que ele ! Um misto de falta de experiência com falta de talento ! Lembro de séries com atores jovens que foram estupendas como presença de Anita e aquela que lançou Ana Paula Arósio....

Quanto a história da Dercy, realmente foi num tiro muito rápido pra compreender como ela entendia o mundo de fato, mas ainda assim me emocionei por ser a comediante que mais vou sentir falta e que mais admirava que já vi na televisão. Lembro que quando soube da morte dela só não fiquei triste por que foi logo após a apresentação dos melhores do mundo dada por eles mesmos (tanto que há uma cena que fingem ser ela na peça, hehehe)

abs !